segunda-feira, 22 de outubro de 2018

Mais uma da Carreira


Ainda recordando algumas situações que me marcaram nestes anos de docência, me lembro de um fato que ocorreu logo no início da minha carreira como professor. Naqueles anos eu era um dos colaboradores da disciplina PRÁTICA HOSPITALAR (acho que era este o nome da disciplina que era oferecida no 9º período do curso de Medicina Veterinária da UFMG).

Pois bem... Em uma aula prática no antigo Salão de Semiologia (hoje não existe mais), havia cerca de 30 alunos esperando um caso clínico para ser analisado e discutido. Eu sempre buscava um paciente internado no HV e, de posse da Ficha Clínica e de todos os exames já realizados, fazíamos um exercício de propedêutica e diagnóstico. Mas naquela semana não havia nada de interessante para a aula. Era um tempo de surtos de gastrenterite hemorrágica, seja por endoparasitoses ou parvovirose/coronavirose. Já tínhamos discutido casos como aqueles e não via muita valia em repetir. Mas o que fazer, então?

Naquela época eu era responsável pelo atendimento de animais exóticos e silvestres. Tínhamos um recinto repleto de coisas que não latiam ou miavam... Decidi! Peguei um coitado de um jabuti que estava internado e levei-o ao Salão. O caso do cascudo era de pneumonia, já diagnosticado e sob medicação.


Entrei no salão sob o olhar incrédulo dos alunos. O que era aquela coisa? Coloquei o dito cujo no chão e fui explicando para todos sobre alguns aspectos importantes da fisioanatomia da espécie, já que nada daquilo era dado para nos, veterinários. Em determinado momento, com a turma já se entretendo com o paciente (que andava insistentemente pelo local), falei muito sério: “Olha, gente, é inadmissível que um veterinário experiente chame este bicho de tartaruga. Isto é um jabuti, totalmente diferente. Assim, não deem mancadas. É uma vergonha para o profissional não saber nem a espécie de seu paciente!”. Pronto; recado dado.

Em determinado momento da aula, quase ao seu final, quando eu estava apresentando as radiografias e alguns exames de sangue, entra pela porta do salão o Professor Titular da Clínica naquela época. Ele, um profissional muito respeitado por todos nós, deu um pigarro de desaprovação ao ver o réptil no chão e, virando-se para mim, disse: “Quem foi que deixou esta tartaruga entrar aqui?”. Foi o suficiente para a turma cair na gargalhada, para o espanto do Mestre que não estava entendendo nada.

E aí vai a foto do objeto da discórdia...


PROGRAMAÇÃO DA SEMANA
SEMIOLOGIA (GMV116)
22/10/2018 = TURMAS A-B-C
Aula Teórica 48-49 (Sistema Tegumentar), PV06, sala 28, 15h00 às 16h40.
Discussão do desafio da semana anterior: Diabete Melito e Catarata.
Desafio da próxima semana: Espondilose e Obstipação.
23/10/2018 = TURMA B
Aula Prática 50-52 (Sistema Tegumentar II), Sala DMV-04, 09h00 às 11h30.
24/10/2018 = TURMA C
Aula Prática 50-52 (Sistema Tegumentar II), Sala DMV-04, 09h00 às 11h30.
26/10/2018 = TURMA A
Aula Prática 50-52 (Sistema Tegumentar II), Sala DMV-04, 09h00 às 11h30.
CINOFILIA (GMV150)
25/10/2018 = TURMA A
Aula Teórica 06 (Grupo 1), DMV01, 10h00 às 10h50.

segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Hoje é dia

Hoje se comemora no Brasil o Dia dos Professores. Será que há o que comemorar? Já estou a mais de 30 anos nesta atividade e ontem, ao lembrar-me da data, dei “uma varrida” na memória buscando os momentos mais marcantes que passei. Foram vários e que gostaria de compartilhar alguns com vocês.


Quando estava começando a carreira docente (lá por volta de 1990-1991), aproveitei uma oportunidade que surgiu para dar aulas de Biologia, Física e Química em um colégio municipal de Belo Horizonte. O salário era horrível (não mudou nada em relação aos dias de hoje, parte I), o local de pouca segurança (não mudou nada em relação aos dias de hoje, parte II) e o alunado tinha pouco ou quase nenhum interesse nas aulas (não mudou nada em relação aos dias de hoje, parte III). Fui.


As aulas eram no período noturno, com turmas cheias e faixa etária mais elevada que nos períodos matutinos. Senti a dificuldade natural de comunicação, ainda mais que eu estava começando no ofício e aquela realmente não era a minha praia. Já tinha um pouco mais de vivência com alunos universitários e alguns de curso de inglês, mas aquela experiência era única.

Em um determinado momento de uma das aulas de Biologia, quando passava a matéria no quadro (pois é, este era o método adotado naquela época (não mudou nada em relação aos dias de hoje, parte IV), notei que um dos alunos mais “erados” roncava na última carteira. Sei que não é fácil engolir Mendel e suas teorias mirabolantes de ervilhas às dez da noite, mas achei aquilo uma falta de respeito. Pois bem, do “alto do pedestal de mestre”, resolvi dar uma lição de moral. Mas, na verdade, fui eu quem aprendi a lição...

Pedi que acordassem o aluno e perguntei se eu o estava incomodando, pois, se assim o fosse, poderia acabar a aula naquele momento, deixando seus colegas sem o conteúdo em função do sono dele. Foi aí que o aluno levantou a cabeça, com os olhos ainda teimando em se manter entreabertos, me encarou e disse uma das coisas que mais me impactou na minha carreira docente e na vida pessoal. Foi mais ou menos assim: “Doutor, o senhor está aí falando de coisas que eu nem sei do que se trata ou para quê servirão. Da minha parte, sou o quinto filho de uma família muito pobre. Minha mãe é prostituta e viciada em drogas e meu pai eu nem sei quem é. Meus irmãos, todos mais jovens, também não sabem quem são seus pais. Eu trabalho o dia inteiro como servente de pedreiro em uma obra na periferia e, como não tenho grana para o ônibus, vou e volto de “magrela” todo dia. Quando chego em casa, encontro meus irmãos com fome, minha mãe drogada e suja e o barraco uma bagunça. Tenho que arrumar tudo e todos em menos de duas horas, pois preciso estar aqui até na hora da merenda, senão durmo com fome. Agora, o senhor, não deve entender nada disso. Seu carro está lá fora, sua comida deve estar esperando no forno e amanhã o senhor não precisa se preocupar com o pão de cada dia. É fácil falar assim quando se tem tudo à mão. Hoje estou mais cansado que nos outros dias. Fui dispensado do meu emprego. Não tem problema: amanhã buscarei outra coisa para fazer. Por isso estou dormindo, já que este tal de Mendel não vai me dar um prato de comida amanhã.”

Fiquei petrificado com esta fala. Senti o mundo balançar e experimentei uma situação que sequer tinha passado (apenas imaginado na minha cômoda situação de classe média). Terminei a aula e me apressei para ir ao estacionamento. Tinha pressa de entrar no carro e sair dali. Aos prantos (já não conseguia segurar) passei pelo portão principal da escola. Aquilo foi tão cruel que não consegui dormir naquela noite. Como disse, foi uma das experiências que nortearam e consolidaram minha carreira docente. Aquilo tudo serviu para me mostrar o quanto somos pequenos na nossa insignificância de ser humano, mas que podemos acolher o outro e oferecer o que é mais valioso, sem cobrar um tostão: a compreensão. Aprendi (um pouco, mas o suficiente) que cada um realmente carrega seu fardo, seus problemas e suas angústias. Eu não tinha nenhum direito de tratá-lo daquela maneira, sequer julgá-lo.


Bom, há tempos aplico o que aquele aluno me ensinou. Não culpo o discente se ele está ou não "ligado” nas aulas, pois aquele pode ser exatamente um “dia de sono”. Cada um sabe até onde pode ir e o peso de sua consciência. A transferência de responsabilidades deve ser ampla nestes casos. Faço a minha parte e deixo que outros façam a deles.


Na próxima postagem coloco outro caso que muito me ensinou netas andanças.

PROGRAMAÇÃO DA SEMANA
SEMIOLOGIA (GMV116)
15/10/2018 = TURMAS A-B-C
Aula Teórica 43-44 (Sistema Tegumentar), PV06, sala 28, 15h00 às 16h40.
Discussão do desafio da semana anterior: Hepatopatias e Prova de Ondulação Abdominal Positiva.
Desafio da próxima semana: Diabete Melito e Catarata.
16/10/2018 = TURMA B
Aula Prática 45-47 (Sistema Tegumentar I), Sala DMV-04, 09h00 às 11h30.
17/10/2018 = TURMA C
Aula Prática 45-47 (Sistema Tegumentar I), Sala DMV-04, 09h00 às 11h30.
19/10/2018 = TURMA A
Aula Prática 45-47 (Sistema Tegumentar I), Sala DMV-04, 09h00 às 11h30.
CINOFILIA (GMV150)
18/10/2018 = TURMA A
Aula Teórica 05 (Exposições Cinófilas), DMV01, 10h00 às 10h50.

segunda-feira, 1 de outubro de 2018

Acumuladores de Animais: Há Algo Além do Óbvio

Esta semana teremos um debate interessante na UFLA (proposto pelo Núcleo de Estudos em Felinos - NEFEL, https://pt-br.facebook.com/nefel.ufla/) sobre um tema muito em voga atualmente: os acumuladores de animais. Trata-se de um assunto que certamente impactará a vida profissional de muitos graduandos de medicina veterinária, já que distúrbios como este estão cada vez mais se fazendo presente na população.


Infelizmente, como qualquer outra assunto pouco conhecido e de grande apelo emocional, a mídia vem sensacionalizando e desvirtuando o verdadeiro caráter deste distúrbio. Por isso é importante que os profissionais que atuarão com esta população (veterinários, psicólogos, psiquiatras, ambientalistas, advogados, etc.) tenham o discernimento técnico adequado para tratar o tema de forma imparcial e adequada aos envolvidos no processo.

Apenas para dar uma pincelada no assunto, desde 2013 a Associação de Psiquiatria Americana adicionou ao seu Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM, em sua 5ª versão), o grupo dos chamados Transtornos de Acumulação. Trata-se de um distúrbio em que o indivíduo, de forma inconsciente, tende a acumular objetos e animais, encontrando dificuldade em interromper esta aquisição ou mesmo de doá-los. É uma condição patológica séria em que os prejuízos se estendem não apenas para o acumulador (sofrimento psíquico), mas também aos animais acumulados (redução do bem estar, doenças), aos seres humanos próximos (discussões e isolamento social), ao ambiente (contaminação, mal cheiro) e aos órgãos públicos (gastos com vigilância, terapia e judicialização).


Por outro lado, em uma sociedade atual cujos princípios e valores se perdem no egocentrismo e na verdade absoluta de pequenos poderes, podem ocorrer julgamentos precipitados, equívocos de avaliação e uma fatal e covarde mistura de ódio, inveja e canalhice. Há casos em que o acusado não é um acumulador, mas simplesmente foge dos padrões considerados “normais” dentro de uma estrutura social pré-estabelecida. Com isso, são apontados, avaliados, segregados e julgados, passando por uma carnificina da alma e interpondo, em sua trajetória de vida, um estigma que nunca será retirado ou esquecido.


Em meu livro “NOSSOS BICHOS, NOSSA FAMÍLIA”, estendo-me longamente em um capítulo sobre o tema, colocando exemplos reais de acumuladores patológicos e alguns casos de erros avaliativos e judiciais. Os episódios reais, muito difundidos em uma série televisiva do grupo Discovery, são de assustar. Mas o mais espantoso é até onde vai a atitude de pessoas que acreditam saber tudo sobre o tema e que destroem vidas de inocentes taxados de acumuladores. Vale a pena dar uma lida neste capítulo para desconstruirmos aquela ideia fixa imposta pela sociedade e por falsos propedêuticos psíquicos.


PROGRAMAÇÃO DA SEMANA
SEMIOLOGIA (GMV116)
01/10/2018 = TURMAS A-B-C
Aula Teórica 33-34 (Sistema Tegumentar), PV06, sala 28, 15h00 às 16h40.
Discussão do desafio da semana anterior: Otite Média e Andar em Círculo.
Desafio da próxima semana: Necrose de Extremidades e Acidente Crotálico.
02/10/2018 = TURMA B
Aula Prática 35-37 (Sistema Linfático; Mucosas Superficiais; Parâmetros Vitais), Sala DMV-04, 09h00 às 11h30.
03/10/2018 = TURMA C
Aula Prática 35-37 (Sistema Linfático; Mucosas Superficiais; Parâmetros Vitais), Sala DMV-04, 09h00 às 11h30.
05/10/2018 = TURMA A
Aula Prática 35-37 (Sistema Linfático; Mucosas Superficiais; Parâmetros Vitais), Sala DMV-04, 09h00 às 11h30.
CINOFILIA (GMV150)
04/10/2018 = TURMA A
Aula Teórica 03 (Histórico da Cinofilia; Exposições Cinófilas), DMV01, 10h00 às 10h50.